Inércia em impugnar reajuste contratual abusivo não viola o princípio da boa-fé objetiva.
A 3ª Turma do Superior Tribunal de Justiça entende que a falta de ação para questionar um reajuste contratual abusivo não é, por si só, uma violação ao princípio da boa-fé objetiva. Isso ocorre mesmo quando anos se passam sem qualquer manifestação e, ainda, quando há a assinatura de uma confissão de dívida.
No entanto, é fundamental considerar que a boa-fé objetiva está intrinsecamente ligada à lealdade e à honestidade nas relações contratuais. A inércia em impugnar um reajuste abusivo pode ser vista como uma falta de integridade por parte do contratante, especialmente se considerarmos que a assinatura de uma confissão de dívida pode ser interpretada como um ato de conformidade. Nesse sentido, a boa-fé objetiva exige que as partes ajam com transparência e respeito mútuo, evitando práticas abusivas e buscando soluções justas e equitativas.
Boa-fé objetiva: um princípio fundamental em contratos
O princípio da boa-fé objetiva é essencial em todas as etapas de um contrato, exigindo conduta leal e honestidade dos contratantes. Isso significa que é impossível validar um contrato com base em suposta supressio em favor da parte que inicialmente agiu com abuso de direito. Em um caso recente, o colegiado aceitou o pedido de uma empresa do ramo alimentício para reconhecer que uma fornecedora de gás natural praticou preços de forma ilegal, aplicando reajustes em percentuais muito superiores ao índice oficial de variação da energia elétrica no Paraná.
O ministro Marco Aurélio Bellizze, relator do caso, enfatizou que a supressio ‘pressupõe a idoneidade das circunstâncias subjacentes ao negócio jurídico, de modo que a parte que tenha desbordado primeiramente dos limites da boa-fé objetiva não pode se beneficiar de eventual e subsequente inação da parte contrária por determinado lapso temporal quanto ao exercício de um direito’. Isso demonstra a importância da lealdade e da integridade em todos os aspectos do contrato.
Comportamento contraditório e boa-fé contratual
Em uma ação revisional de contrato, com pedido de devolução dos valores pagos indevidamente, o juízo de primeiro grau deu razão à contratante do serviço e determinou que os preços fossem recalculados considerando o reajuste anual com base apenas nos índices do mercado cativo de energia elétrica. Além disso, mandou que fossem restituídos os valores pagos a mais durante a vigência do contrato. No entanto, o Tribunal de Justiça do Paraná reformou a decisão sob o argumento de que o cálculo utilizado seria compreensível e que o contrato vigorou por mais de cinco anos sem qualquer reclamação, o que indicaria comportamento contraditório por parte da contratante e ofensa ao princípio da boa-fé contratual.
O ministro Bellizze verificou que a cláusula de reajuste do contrato de fornecimento de gás natural não é clara, pois a fórmula adotada não está prevista expressamente, o que seria consideravelmente prejudicial à contratante. Isso demonstra a importância da transparência e da honestidade em todos os aspectos do contrato.
Cláusula com conteúdo aberto e boa-fé objetiva
Bellizze ressaltou que a fornecedora adotou comportamento contrário à boa-fé objetiva, pois utilizou critério unilateral de reajuste visivelmente mais prejudicial à contratante. ‘Em consequência, não se apresentando idônea essa situação, ressai descabido a essa mesma parte beneficiar-se de suposta inércia da autora em buscar tal correção em momento anterior, que pudesse caracterizar a supressio (perda do seu direito de impugnar cobrança abusiva)’, concluiu o ministro ao dar provimento ao recurso especial para restabelecer a sentença. Isso demonstra a importância da integridade e da lealdade em todos os aspectos do contrato.
Fonte: © Conjur
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