Perdas persistente e Selic alta criam barreira para investidores voltarem, viés do arrependimento atua, e concorrência com fundos de renda fixa é grande, investidores buscam alternativas.
Entre 2022 e 2023, os investidores brasileiros, ainda sob impacto dos choques de 2021, agravados pela pandemia, mudaram suas estratégias. Perdas foram significativas nos ativos de risco. A busca por soluções buscou caminhos alternativos, como os investimentos em renda fixa, tornando-se modelo de correção de perdas. A renda fixa, apesar de oferecer menor rentabilidade, tem o mérito de fornecer perdas mais controláveis, uma vez que as taxas de juros são fixas e conhecidas.
Em 2024, essa tendência se manteve. Perdas com os fundos de ações e multimercados continuaram a ser um tema recorrente. A busca por alternativas seguras e com menor risco levou muitos investidores a abandonar a ideia de investir em ativos de risco, optando por investimentos com retorno garantido. Perdas podem ser minimizadas com o investimento em renda fixa, garantindo assim a estabilidade financeira.
Perdas em Multimercado Perdem Atração para Investidores
O mercado financeiro brasileiro experimentou o terceiro ano consecutivo de resgates líquidos em fundos multimercados, um total de R$ 356 bilhões em 2024, conforme a Associação Brasileira das Entidades dos Mercados Financeiro e de Capitais (Anbima). Este número representa uma saída impressionante de 22% em relação ao patrimônio líquido médio do ano. A participação do segmento no total da indústria caiu 7 pontos percentuais, de 22,8% em 2021 para 15,7% nos dias atuais.
Um estudo sobre fundos oferecidos para investidores revela que apenas um terço destes fundos conseguiu superar o CDI (referência de mercado que acompanha a Selic) em 2024, o que também ocorreu no ano anterior. Em relação aos fundos de ações, a situação também é desanimadora, apenas 40% deles sendo capazes de superar o Ibovespa. As classificações de fundos de ações acompanhadas pela Anbima mostraram que apenas uma logrou alcançar rentabilidade positiva. Já entre os multimercados, somente uma classe, entre 11, superou o CDI, com 10,92%.
A explicação para os resgates maciços em multimercado remonta a dois fatos intrinsecamente relacionados: as rentabilidades inferiores ao CDI, que se espalham por muitos fundos, e a concorrência com as taxas de juros. A literatura de finanças costuma dizer que os investidores buscam maximizar o retorno dos seus investimentos ou, mais especificamente, a relação entre risco e retorno. No entanto, o mais adequado deve ser algo como os investidores buscam evitar perdas e, então, maximizar a remuneração dos recursos. E, quando falamos em perdas, estamos nos referindo tanto àquelas em termos absolutos, valores negativos, quanto às relativas, abaixo da taxa básica de juros, ou do CDI.
Segundo os estudos de Daniel Kahneman e Amos Tversky, que resultaram na teoria da perspectiva, ou teoria do prospecto, a sensação, ou valor que atribuímos as perdas e ganhos não é simétrico. A dor causada pela perda equivale a cerca de 2,5 vezes o prazer obtido com o ganho de uma aposta. Os investidores brasileiros estão, em sua ampla maioria, há pelo menos dois anos apanhando e sofrendo com perdas absolutas ou relativas. Se fosse possível fazer esta conta, poderíamos tentar especular quanto os investidores esperariam ganhar nos próximos dois anos para poder compensar a dor dessa perda incorrida.
Uma perda de 1/5 do patrimônio líquido não é usual e indica que os investidores de multimercado estão machucados e cansados. A saída é uma resposta às perdas, mas a pergunta que interessa é sobre o futuro, é sobre o que os fará voltar. Mais especificamente, qual nível de rentabilidade será suficiente para voltar a atraí-los? Quantos meses de rentabilidade acima do CDI serão necessários para convencê-los de que ‘agora vai’? Junte-se à aversão à perda o viés do arrependimento, e a situação parece ser mais complexa. Ou seja, perdas que se propagam por tempo demasiado tendem a aumentar a resistência para se voltar ao investimento de risco.
Fonte: @ Valor Invest Globo
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